quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Acelerando a Ferrari California...


Era para ser só mais um domingo à tarde. Estava indo almoçar fora quando derepente vejo um pequeno tumulto à minha frente. Carros parados, gente curiosa em volta. Quando olhei, lá estava ela, deslumbrante, mesmo cercada por outras beldades. Ali, irresistível, vestida de vermelho, virava assunto de quem passava pelo local. Ver uma Ferrari na Avenida Europa, onde estão nove entre dez lojas de carros chiques em São Paulo, não é novidade nenhuma — basta passar lá para conferir. Mas essa não era simplesmente uma Ferrari. Era a nova California. E mais que isso: é a primeira delas (e por enquanto a única) a colocar seus pneus sobre solo brasileiro. Quem quiser a primazia de tê-la na garagem vai pagar o preço da exclusividade. A California está à venda na Só Veículos Multimarcas pela bagatela de R$ 2,1 milhões. Se fosse pela minha conta bancária eu também ficaria ali só babando. Mas — bendita seja a hora que resolvi ser jornalista automotivo – consegui agendar uma voltinha com ela. Quase uma semana depois, no sábado bem cedo, estávamos na loja para o passeio. Ao lado da California brilhavam Audi R8, Mercedes C63 AMG, Porsche Cayman e até um Bentley Continental GT, mas nada era como ela. Você pode até não gostar de alguns ângulos da nova Ferrari em fotos, mas, ao vivo, garanto que ela impressiona. Os vincos e recortes na carroceria, as rodas aro 19, a tomada de ar no capô... É difícil saber o que mais prende sua atenção. Na verdade, acho que só o fato de ser uma Ferrari inédita no país já vale o show.
Enquanto o fotógrafo Fabio Aro posicionava seus flashes na direção da lataria, eu já caía no cockpit para ir me familiarizando. A chave é simples, nada do tipo canivete. A parte metálica é quase idêntica com a do Palio que estava comigo naquele dia – o que o Fiat não tem, claro, é o cavalinno moldado no plástico da peça. O ambiente é de carro de luxo. As Ferraris de acabamento espartano ficaram na década passada, mas a California causa ainda melhor impressão do que uma F430. O console central prateado em formato de ponte rouba a cena, enquanto outros detalhes fazem você duvidar que está numa Ferrari. Se até pouco tempo as macchinas da marca sequer tinham rádio, essa tem entrada para i-Pod e até uma tela digital no centro do painel. Outra tela, menor, acende no lado esquerdo do quadro de instrumentos. Ela concentra informações como temperatura do motor e do óleo, pressão dos pneus, dados do computador de bordo e o mostrador do tanque de combustível. O conta-giros com escala até 10.000 rpm, bem ao centro, e o velocímetro à direita mantêm o padrão Ferrari. Mas o capricho do ambiente deixa claro que a California nasceu para encantar quem anda de Mercedes SL, e não somente os fãs da marca italiana. Por falar no Mercedes, precisamos manobrar um SL 65 AMG para sair com a California da vitrine. Primeiro, o Audi R8 despertou seu V8, seguido do não menos belo ronco de outro V8, o da C63 AMG. Isso até que o SL deu a partida no seu V12 biturbo, com um rugido de envergonhar os demais — menos a California. Viramos a chave na ignição, apertamos o botão Engine Start no volante e... “grauu... huhuhuhuhu”, eis a voz inconfundível de uma Ferrari subindo pelas paredes da loja. Hora do passeio. Saindo devagar, a primeira coisa que chama a atenção (além de uma California em meio ao trânsito paulistano) é a docilidade do esportivo. O V8 anda em baixas rotações sem reclamar, e a dianteira não é tão baixa quanto a da F430. Claro que a gente ainda tem que tomar (muito) cuidado nas valetas, mas é mais tranquilo andar com a California em nossas ruas do que com outras Ferraris. Por um botão giratório no volante, o mannetino, ainda podemos deixar a suspensão (que é bem firme) mais suave. A carroceria chacoalha ao menor sinal de imperfeição do solo, mas a direção é leve como a de um Honda Civic nas manobras. O câmbio automatizado faz a estreia da dupla embreagem na Ferrari. Tem sete marchas e trocas muito rápidas, quase imperceptíveis. Você pode deixá-lo no modo automático apertando um botão do console central e apenas curtir o passeio. Ou passar o comando para você mesmo fazer as trocas pelas borboletas atrás do volante (+ na direita, - na esquerda). Adivinha qual usei? Escolhemos um local para as fotos em que era preciso parar e manobrar. Moleza. Basta puxar as duas borboletas ao mesmo tempo para deixar em ponto morto e, então, apertar outro botão no console para engatar a ré. Daí você manobra e, acredite, conta até com sensores de ré apitando. Isso mesmo, Ferrari com sensor de estacionamento. Os tempos realmente mudaram.

Ainda no console central há outro botão que eu queria experimentar, mas não rolou. É o do controle de largada, que ajusta o grau de patinamento da embreagem para arrancar o mais rápido possível. O que mexi foi nos botões dos vidros, que também estão no tal console – e não nas portas, onde deveriam estar (achei um defeito!). Logo à frente deles fica o botão de abertura da capota rígida. São 14 segundos de espetáculo vendo o mecanismo recolher o teto atrás das nossas cabeças. A curtição aumenta não só pelo vento no rosto, mas principalmente pelo ronco do V8 mais próximo dos ouvidos. Nada como andar de Ferrari por onde passo todo dia com meu carro e ouvir aquela sinfonia ecoando na copa das árvores. A California sabe ser dócil num passeio matinal, mas assim que entramos numa avenida mais larga ela mostra que é uma legítima Ferrari. O V8 de 4,3 litros, 460 cv e 49,4 kgfm (derivado do motor da F430) empurra o esportivo com violência quando aplicamos pressão no pedal da direita. O giro sobe, o ronco cala a vizinhança e você deixa os outros carros para trás num piscar de olhos. Foi só um aperitivo, mas suficiente para acreditar nos números de fábrica: 0 a 100 km/h em 3,9 segundos e máxima de 310 km/h. Mesmo com 200 kg a mais e 30 cv a menos que uma F430, a California anda como se espera de uma Ferrari. Viramos à direita e meus 15 minutos de fama chegam ao fim na porta da importadora. Apesar de rápido, meu contato com a California só confirmou o que eu já desconfiava: se eu tivesse R$ 2 milhões no banco, a essa hora eles já estariam migrando para a conta da Só Veículos...

Fonte: Autoesporte - Daniel Messeder // Fotos: Fabio Aro